Ribeiro Cury

A JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE NO BRASIL

Insatisfação com planos de saúde, ausência de medicamentos e dificuldade de acesso a tratamentos de alto custo e procedimentos médicos são alguns dos fatores que têm impulsionado o aumento das ações judiciais para assegurar um direito fundamental garantido pela Constituição: o direito à saúde.

O número de ações judiciais relacionadas à saúde tem registrado um crescimento expressivo nos últimos anos. Dados do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) demonstram aumento de 130% entre 2008 e 2017[1]. No mesmo período, o número total de processos judiciais cresceu 50%, ou seja, o crescimento das ações de saúde foi muito superior ao crescimento das demandas gerais no Judiciário.

Em 2022, a situação continuou, uma vez que houve aproximadamente 460 mil novos processos judiciais sobre saúde no Brasil, sendo 164 mil voltados especificamente à saúde suplementar, conforme informações do Painel de Estatísticas Processuais de Direito da Saúde, do CNJ.[2]

Nesse cenário, os principais pedidos feitos pelos pacientes incluem o fornecimento de medicamentos, órteses e próteses, tratamentos médicos e hospitalares, realização de exames e procedimentos, disponibilização de leitos hospitalares e cobertura por planos de saúde, muitas vezes motivados pela recusa de tratamentos ou medicamentos por parte das operadoras.

Além disso, vale destacar que a responsabilidade por erros em tratamentos médicos não se limita apenas a médicos.

Recentemente, a 5ª Câmara de Direito Privado do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJSP) manteve a decisão da Vara Única de Vargem Grande Paulista que condenou dentistas a indenizarem uma mulher por erro médico em tratamento odontológico[3].

Isto porque, o laudo pericial confirmou que os implantes foram colocados em áreas infectadas, o que caracterizou erro médico/odontológico. Além disso, não houve comprovação de que a paciente foi adequadamente informada sobre os riscos do procedimento, violando o dever de informação.

Assim, o Relator João Batista Vilhena reforça que a realização de implantes em áreas infectadas foi um erro, pois deveria ter sido feita a limpeza (desbridamento) antes do procedimento.

Dessa forma, o Tribunal negou provimento ao recurso e manteve a condenação de R$ 19.300,00 por danos materiais (gastos com o tratamento), R$ 2.000,00 por danos estéticos, R$ 30.000,00 por danos morais e a seguradora também foi condenada nos limites do contrato.

Com efeito, a decisão reforça a crescente responsabilização de profissionais da saúde, incluindo dentistas, por erros médicos e falhas na prestação de serviços.

O Supremo Tribunal Federal (STF) e o Superior Tribunal de Justiça (STJ) têm uma vasta jurisprudência sobre o direito à saúde.

Um dos precedentes importantes do STF é o Tema n° 500, que trata sobre o fornecimento de medicamentos não registrados pela ANVISA, estabelecendo que não é obrigação do Estado fornecer medicamentos experimentais. Entretanto, excepcionalmente, o fornecimento pode ser determinado judicialmente, desde que se cumpram os seguintes critérios: i) mora irrazoável da ANVISA para analisar o pedido de registro (prazo superior ao previsto na Lei nº 13.411/2016); ii) existência de pedido de registro do medicamento no Brasil (exceto para medicamentos órfãos destinados a doenças raras ou ultrarraras); iii) o medicamento tem registro em agências reguladoras renomadas no exterior; iv) não existe substituto terapêutico registrado no Brasil.

No âmbito do STJ, um precedente significativo é o Tema n° 84, que estabelece que o juiz deve adotar todas as medidas necessárias para garantir a efetividade de suas decisões, incluindo, quando necessário, o sequestro de valores do devedor (bloqueio judicial). E essas medidas devem ser tomadas com base em seu arbítrio e acompanhadas de adequada fundamentação, assegurando a proteção do direito à saúde.

Esses entendimentos demonstram a atenção do judiciário à proteção dos direitos dos consumidores de serviços de saúde.

Portanto, se você se encontra em uma situação em que seus direitos à saúde estejam sendo negados, como a recusa de tratamentos, medicamentos, exames ou cobertura por planos de saúde, é necessário buscar orientação jurídica.

 

Por Gabriele Bandeira Borges.

 

REFERÊNCIAS:

[1] EXECUTIVO, S. JUSTIÇA PESQUISA JUDICIALIZAÇÃO DA SAÚDE NO BRASIL: PERFIL DAS DEMANDAS, CAUSAS E PROPOSTAS DE SOLUÇÃO. [s.l: s.n.]. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2018/01/f74c66d46cfea933bf22005ca50ec915.pdf. Acesso em: 17 mar. 2025.

[2] LOBO, T. M. C. Saúde suplementar pontua impacto de processos judiciais para equilíbrio do setor. Disponível em: <https://www.cnj.jus.br/saude-suplementar-pontua-impacto-de-processos-judiciais-para-equilibrio-do-setor/>. Acesso em: 17 mar. 2025.

[3] DE, S. Dentistas indenizarão mulher por erro médico em tratamento odontológico. Disponível em: <https://www.tjsp.jus.br/Noticias/Noticia?codigoNoticia=106406&pagina=3>. Acesso em: 17 mar. 2025.