Ribeiro Cury

Animais de Estimação na Dissolução Familiar: Avanços e Soluções no Direito de Família

A presença de animais de estimação dentro dos lares tem ganhado contornos jurídicos relevantes nos últimos anos diante das mudanças da sociedade e suas diversas formas de configuração familiar.

Embora atualmente os tutores considerem seus animais de estimação como membros da família, devido à companhia e felicidade que proporcionam, a Lei e a Doutrina, tradicionalmente, possuem olhar diferente.

O Código Civil, através do seu artigo 82, prevê que os pets são considerados bens móveis “suscetíveis de movimento próprio, ou de remoção por força alheia, sem alteração da substância ou da destinação econômico-social”.

À sombra desse raciocínio, os tribunais pátrios têm adotado uma visão semelhante àquela aplicada aos filhos, mas sempre destacando a ausência de personalidade jurídica dos animais.

Contudo, recentemente, o STJ trouxe um importante entendimento sobre o tema ao analisar o RECURSO ESPECIAL Nº 1.713.167 – SP[1], onde se reconheceu o direito de visitas ao animal que fora adquirido na constância da união estável.

Nas palavras do relator do caso, Ministro Luis Felipe Salomão, “os animais de companhia são seres que, inevitavelmente, possuem natureza especial e, como ser senciente – dotados de sensibilidade, sentindo as mesmas dores e necessidades biopsicológicas dos animais racionais -, também devem ter o seu bem-estar considerado.”

Na mesma linha desta concepção, têm sido cada vez mais comuns discussões no Poder Judiciário sobre guarda de animais e obrigações pecuniárias. Em decisão monocrática do STJ, no Agravo de Recurso Especial nº 1860806 SP 2021/0082785-0, o relator Ministro Ricardo Villas Bôas Cueva expõe que “(…) Justamente em virtude da evolução da matéria, que hoje já se pode falar em guarda e até pensão alimentícia para os bichos, exatamente sob a rubrica de ‘pensão’.”[2]

Além disso, tem-se o Enunciado N° 11 do Instituto Brasileiro de Direito de Família (IBDFAM), que assim prescreve: “Na ação destinada a dissolver o casamento ou a união estável, pode o juiz disciplinar a custódia compartilhada do animal de estimação do casal.”[3]

Ainda, em casos em que há consenso entre o casal, é possível estipular sobre a guarda, obrigações pecuniárias e regime de visitas dos animais domésticos seja na escritura pública de dissolução de União Estável e/ou de divórcio, seja no processo de divórcio consensual.

Há, inclusive, o Projeto de Lei N° 179/2023[4] que prevê o termo “família multiespécie” como aquela formada por pessoas que convivem com seus animais. O PL está em análise na Câmara dos Deputados e disciplina diversas situações como a questão da dissolução da união estável, divórcio, pensão alimentícia, guarda, regulamentação de visitas etc.

É importante destacar que é fundamental consultar um advogado especializado para orientação adequada em casos de separação e, portanto, garantir que o animal receba os cuidados necessários, mesmo após a separação dos tutores.

Afinal, dialogando com outros campos de conhecimentos como enfatiza Felipe Süssekind[5] (2018, p 178), nosso pensamento está implicado em sentidos múltiplos, sendo necessário diálogos e relações que ensejem “novas possibilidades de leitura e de escrita a partir de alianças não só com outros grupos humanos, mas com animais”.

É o desafio que a experiência da vida multiespécie nos apresenta.

Por Gabriele Bandeira Borges

REFERÊNCIAS:

[1] STJ, REsp 1.713.167 SP 2017/0239804-9, relator: ministro LUIS FELIPE SALOMÃO, Data de Julgamento: 19/06/2018, T4 — QUARTA TURMA, Data de Publicação: DJe 09/10/201.

[2] STJ – AREsp: 1860806 SP 2021/0082785-0, Relator: Ministro RICARDO VILLAS BÔAS CUEVA, Data de Publicação: DJ 18/06/2021)

[3] IBDFAM : Instituto Brasileiro de Direito de Família. Ibdfam.org.br. Disponível aqui. Acesso em: 26 jun. 2023.

[4] Portal da Câmara dos Deputados. Camara.leg.br. Disponível aqui. Acesso em: 26 jun. 2023.

[5] SÜSSEKIND, Felipe. Sobre a vida multiespécie. Revista do Instituto de Estudos Brasileiros, p. 159-178, 2018.