Frequentemente, ao utilizar um estacionamento, seja ele em um supermercado, shopping center, ou qualquer estabelecimento, é comum deparar-se com o seguinte aviso: “Não nos responsabilizamos por objetos deixados no veículo”.
Contudo, o Superior Tribunal de Justiça sumulou o entendimento acerca do tema, através da Súmula 130, que diz: “A empresa responde, perante o cliente, pela reparação de dano ou furto de veículo ocorrido em seu estabelecimento.”
Tem-se, portanto, que o proprietário de um estabelecimento comercial que disponibiliza um estacionamento para seus clientes, ou, ainda, que seja sua prática comercial, ao propor a guarda do automóvel, a ele é atribuído a condição de “depositário” do veículo por determinado tempo, e independente de pagamento pelo serviço, deve zelar pelo bem, o qual responde, de maneira objetiva, ou seja, independente de culpa, por danos ao veículo e objetos deixados em seu interior.
É importante ressaltar a relação de consumo existente entre estabelecimento comercial e consumidor, e a segurança que o fornecedor deve prestar ao cliente, conforme descreve o artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, mais precisamente em seu parágrafo primeiro:
“Art. 14. O fornecedor de serviços responde, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos relativos à prestação dos serviços, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua fruição e riscos.
§ 1° O serviço é defeituoso quando não fornece a segurança que o consumidor dele pode esperar, levando-se em consideração as circunstâncias relevantes, entre as quais:
I – o modo de seu fornecimento;
II – o resultado e os riscos que razoavelmente dele se esperam;
III – a época em que foi fornecido.”
Assim sendo, infortúnios ocorridos no gozo da prestação de serviço são dignos de ressarcimento, independente de culpa, como preconiza o Código de Defesa do Consumidor.
Nesse sentido, não resta dúvida da responsabilidade objetiva do fornecedor (empresa) em arcar com os prejuízos suportados pelos consumidores nas dependências de seu comércio.
Todavia, ainda há discussão em relação ao roubo à mão armada, praticado mediante grave ameaça e com emprego de arma de fogo, de modo que os estabelecimentos comerciais alegam tratar-se de fortuito externo, caracterizando assim o fato de terceiro, o qual exclui a responsabilidade objetiva do estabelecimento.
Ocorre que, em decisão de 14 de março de 2023, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), no REsp nº 2.031.816, entendeu que shopping center e empresa administradora de estacionamento são responsáveis por indenizar consumidor que foi vítima de roubo à mão armada ocorrido na cancela para ingresso do estacionamento. [1]
Segundo a relatora do recurso, ministra Nancy Andrighi, a proteção do Código de Defesa do Consumidor incide não somente durante a prestação de serviço, como também nos momentos que o antecedem e o sucedem, desde que vinculados à sua execução.
Nesse sentido, ao disponibilizar obstáculo físico para controle da entrada de terceiros no estacionamento, os estabelecimentos propiciam uma sensação de segurança ao consumidor, ainda que o ato criminoso tenha ocorrido antes de ultrapassada a cancela.
Foi destacado também, a conduta exigida ao consumidor para que usufrua do serviço prestado pela fornecedora, ou seja, o consumidor submete-se, com a finalidade de ingressar no estacionamento, a reduzir a velocidade ou até mesmo parar seu veículo, diante a barreira física (cancela) imposta pelo fornecedor em seu benefício, e com isso incide a proteção consumerista, ainda que não tenha ultrapassada referida cancela.
Apesar de o shopping center e a empresa administradora terem alegado que não tinham o dever de indenizar, haja vista no momento do roubo, o veículo ainda se encontrava em via pública, bem como tratar-se de um evento fortuito, pois não possuía relação com a conduta do estabelecimento, esse não foi o entendimento do STJ, que condenou as empresas ao pagamento de indenização por danos materiais no valor de R$ 33.750,00 (trinta e três mil e setecentos e cinquenta reais), e danos morais arbitrados em R$ 10.000,00 (dez mil reais).
A ministra ressaltou ainda que não cabe dúvida de que a empresa que oferece estacionamento ao cliente, visa fornecer comodidade e segurança, o qual deve responder por eventuais defeitos ou deficiências na sua prestação. Aponta ainda, que serviços dessa natureza têm como objetivo atrair maior número de consumidores ao estabelecimento, e consequentemente, o lucro, devendo então, suportar os respectivos ônus.
Dessa forma, qualquer tipo de anúncio que tente descaracterizar a obrigação do estabelecimento comercial por eventuais danos suportados pelos consumidores, relacionados a prestação de serviço oferecida, inclusive quanto ao estacionamento, caracteriza-se prática abusiva e, portanto, nula.
Assim, resta claro que, diante a deficiência da prestação do serviço, deverá o estabelecimento comercial arcar com os prejuízos suportados pelo consumidor.
À vista disso, conclui-se que, de acordo com o entendimento do STJ, a responsabilidade dos estabelecimentos comerciais é objetiva, bem como esta responsabilidade inicia-se nos momentos que antecedem e sucedem a referida prestação de serviço, trazendo ainda mais segurança jurídica aos consumidores.
Por Amanda Pilla Brambila.
REFERÊNCIAS:
[1] Motorista roubado antes de cruzar a cancela do estacionamento de shopping será indenizado. Disponível aqui.