Nas últimas semanas, a atenção da população se voltou ao tema da descriminalização das drogas. Isso porque, no dia 24 de agosto, foi retomado o julgamento do Supremo Tribunal Federal (STF) do Recurso Extraordinário nº 635659, com repercussão geral (tema 506), em que é discutida a descriminalização do porte de maconha para consumo próprio.
O julgamento acabou sendo novamente suspenso, por pedido de vista do ministro André Mendonça. Apesar disso, o tema é de extrema relevância, e acompanha a tendência internacional de liberação do consumo de drogas, especialmente a maconha.
Conforme levantamento realizado pelo G1 (1), não há punição para consumo e porte de maconha para uso pessoal em países como Alemanha, Argentina, Canadá, Dinamarca, Holanda, Peru, Portugal e Uruguai. Nos Estados Unidos da América, em 23 dos 50 estados, é legal o consumo de maconha, além de sua plantação e comércio serem regulados.
No caso do Brasil, atualmente é considerado crime adquirir, guardar, ter em depósito, transportar ou trazer consigo drogas para consumo pessoal, assim como semear, cultivar ou colher plantas destinadas à preparação de pequena quantidade de droga, conforme previsto no art. 28 da Lei nº 11.343/2006, conhecida como Lei de Drogas.
Além disso, não há um critério legal nítido que diferencia as figuras do usuário e do traficante, de forma que a tipificação é realizada com base na natureza e a quantidade de substância apreendida, forma e o local em que ocorreu a apreensão, circunstâncias sociais e pessoais da pessoa, bem como conduta e antecedentes criminais. Isso, porém, abre margem para definições discriminatórias e arbitrariedades.
A título de exemplo, destaca-se pesquisa realizada em 2019 pela Agência Pública, que analisou quatro mil sentenças de crimes relacionados à Lei de Drogas na cidade de São Paulo (2). Uma das conclusões da pesquisa foi que pessoas negras são processadas por tráfico com menores quantidades de drogas do que pessoas brancas: entre os réus brancos foram apreendidas em média 85 gramas de maconha, 27 gramas de cocaína e 10,1 gramas de crack; enquanto entre os réus negros, foram apreendidas em média 65 gramas de maconha, 22 gramas de cocaína e 9,5 gramas de crack.
Assim, é essencial que haja um critério nítido para diferenciar o consumo pessoal do tráfico, sendo este um dos pontos discutidos no julgamento do STF. Os parâmetros sugeridos pelo ministro Alexandre de Moraes são no sentido de presumir como usuárias as pessoas flagradas com 25 a 6 gramas de maconha, ou que tenham até seis plantas fêmeas.
A ministra Rosa Weber acompanhou este entendimento, afirmando que “a incongruência normativa, alinhada à ausência de objetividade para diferenciar usuário de traficante, fomenta a condenação de usuários como se traficantes fossem”.
Trata-se de tema controverso, tendo em vista as críticas acerca de possível avanço da Corte nas prerrogativas do Congresso Nacional. Acerca disso, o ministro relator Gilmar Mendes ressaltou a necessidade de unir esforços entre os Três Poderes para pensar em um marco regulatório para discutir a questão das drogas.
Até o momento, cinco ministros do STF já se manifestaram a favor da descriminalização (Gilmar Mendes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Alexandre de Moraes e Rosa Weber) e um ministro proferiu voto em contrário (Cristiano Zanin), restando ainda a apreciação de cinco ministros. Com a suspensão do julgamento, o ministro André Mendonça tem até 90 dias para devolver o caso ao Plenário.
Por Carla Martins de Oliveira
REFERÊNCIAS:
(1) Levantamento do G1 Disponível aqui.
(2) Pesquisa da Agência Pública Disponível aqui.