Ribeiro Cury

CONTRAFAÇÃO E A JUDICIALIZAÇÃO DA VENDA ILEGAL DE CURSOS ONLINE

Na última década, tornou-se comum encontrar na internet – especialmente em aplicativos de mensagens como o Telegram – canais voltados para a revenda ilegal de cursos online. E essa é uma prática que engloba vários nichos, como preparação para concursos públicos, OAB e até mesmo cursos de idiomas. Assim, o administrador do grupo adquire o curso de forma legítima e vende o acesso aos participantes e membros do canal, geralmente por um valor muito inferior.

Ocorre que, decisões judiciais recentes mostram que a internet não é uma “terra sem lei” e que essa prática pode gerar responsabilidade civil e indenização. Foi o que ocorreu em ações movidas pelo Gran Cursos Online, uma das maiores empresas do setor educacional digital no Brasil.

No ano de 2024, a 10ª Vara Cível de Brasília[1] reconheceu que a disponibilização de videoaulas e materiais didáticos sem autorização configurava violação de direitos autorais, enquadrada como “contrafação” nos termos do artigo 5º, VII, da Lei 9.610/1998 (Lei de Direitos Autorais). O Juízo ressaltou que os termos de uso da plataforma proibiam expressamente a cessão gratuita ou onerosa do conteúdo adquirido e que a venda não autorizada prejudicava os professores titulares dos direitos cedidos.

Ressalta-se que a Lei de Direitos Autorais também expressa em seu art. 102:

Art. 102. O titular cuja obra seja fraudulentamente reproduzida, divulgada ou de qualquer forma utilizada, poderá requerer a apreensão dos exemplares reproduzidos ou a suspensão da divulgação, sem prejuízo da indenização cabível.

Em outro caso, o Tribunal de Justiça do Distrito Federal e Territórios (TJDFT) destacou em acórdão[2] que a comercialização indevida dos cursos se enquadra como ato ilícito de contrafação e gera obrigação de não fazer (cessar a prática) e de indenizar os danos materiais causados. No caso específico, ficou comprovado que o réu vendia cursos via WhatsApp por valores entre R$ 90,00 (noventa reais) e R$ 109,00 (cento e nove reais), totalizando R$ 5.162,00 (cinco mil, cento e sessenta e dois reais) obtidos ilicitamente. Assim, esse valor foi fixado como indenização por danos materiais, corrigido monetariamente e acrescido de juros. Além disso, o tribunal manteve a multa de R$ 5.000,00 (cinco mil reais) para cada ato de comercialização indevida que viesse a ocorrer.

A decisão se fundamenta no artigo 5º, XXVII, da Constituição Federal, que assegura aos autores o direito exclusivo de utilização de suas obras, e nos artigos 186 e 927 do Código Civil, que estabelecem a responsabilidade daquele que, por ação ou omissão voluntária, causa dano a outrem. Veja-se:

Art. 5º (…) XXVII – aos autores pertence o direito exclusivo de utilização, publicação ou reprodução de suas obras, transmissível aos herdeiros pelo tempo que a lei fixar;

Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.

Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.

É importante destacar que essa prática não é a mesma que o simples compartilhamento de informações entre amigos de estudo. Trata-se de exploração econômica indevida, mesmo que os réus tentem justificar a falta de lucro ou alegar desconhecimento da ilicitude.

Dessa forma, a decisão reforça que há limites claros para a circulação de bens digitais. Assim como ocorre com softwares e jogos eletrônicos, a revenda de cursos sem autorização é considerada violação de propriedade intelectual, sujeita a sanções civis e até criminais.

Portanto, mesmo que a internet torne mais fácil a disseminação e o acesso aos conteúdos, os usuários precisam entender que comprar um curso online não lhes dá o direito de revender ou compartilhar o material à vontade.

Ademais, se você se depara com a revenda não autorizada de cursos ou com a utilização indevida de materiais de sua autoria, é necessário buscar orientação jurídica para proteger seus direitos autorais e evitar prejuízos financeiros.

Por Gabriele Bandeira Borges.

 

REFERÊNCIAS:

[1] TJDFT. 10ª Vara Cível de Brasília. Sentença. N. Processo: 0705026-26.2024.8.07.0001. Juíza de Direito: Bruna de Abreu Färber. Data: 19/06/2024

[2] TJDFT. 1ª Turma Cível. Apelação Cível. N. Processo: 0747680-96.2022.8.07.0001. Relator: TEOFILO RODRIGUES CAETANO NETO. Órgão julgador: Gabinete do Des. Teófilo Caetano. Data: 22/03/2024.